Fuchsia

Entrar na casa do Cedro significava passar por um pequeno portão de grades, um pequeno jardim, tocar à campainha e esperar, junto a um arbusto de fuchsia, que viesses abrir a porta. Quando a abrias, eu ainda me demorava a fitar os brincos de princesa e tu dizias, com voz delicada e doce: “são brincos de princesa”. Não precisava de ser um colibri para sentir o magnetismo das cores. Não havia dúvida quanto à realeza dos saiotes de pétalas e sépalas. O mundo ao contrário dos estames e do estigma, esse sim, era simplesmente inesperado. Aquelas flores hipnotizavam-me. Como se não bastasse, chamavam-lhes “brincos de princesa”. Não seria preciso revestir a casa de chocolate para fazer Hansel e Gretel entrar em vossa casa. Gretel entraria no reino de fantasia, de mão dada e arrastando o irmão, pouco interessado no mundo das princesas. O outro objecto de princesa podia ser encontrado no quarto da minha tia mais nova. A caixinha de música.

A casa tinha um cheiro característico, inesquecível. A limpo, do detergente do chão e da roupa, misturado com uma domesticidade de alcatifa, pele dos sofás e pelo curto de cão baixinho. Primeiro, foi um cão branco com manchas pretas chamado Skip. Depois, foi um cão igualmente baixo, mas de pelo comprido, preto, com algumas listas brancas. Mais tarde, foram gatos, que só à revelia conseguiam entrar em casa. Esses sentavam-se nos muros do quintal, observando tudo ou tosquenejando ao sol.

No quintal, sentia-se a fragância do arbusto de lúcia-lima. Havia molhos de ramos a secar para fazer chá. O chá de limonete e o doce de tomate eram uma constante da vossa casa, irrepetíveis fora dela.

As rosas havia-as de várias cores. Couves. Limoeiros. Não admira que van Gogh tenha pintado batatas.

Na zona mais sombria do exterior da casa, corridas de crianças lambiam o frio dos azulejos verdes e brancos. Não raramente, desembocavam numa rampinha de pedra, onde se esfolavam os joelhos.

Continuo com quatro anos, a visitar-vos e a esperar, junto ao arbusto de fuchsia, que abras a porta.